Em
1968 eu estava em São Paulo na casa da outra tia paterna. Havia
tomado uma importante decisão: não sair “daqui” sem tirar isto
a limpo, custasse o que custasse. O ódio era um imenso deserto de
sal dentro do peito. Bebia dos mais radicais revolucionários, todo
conhecimento que pudesse me instrumentalizar para a melhor vingança
que puderia vir a conceber.
O
ódio e a vingança eram o prazer, a parte boa deste “status”
de espírito do meu personagem. O contra ponto, a parte ruim, era o
intenso e desesperador medo, que com o decorrer do tempo se
desdobrou em síndromes de pânico, psicose maníaco-depressiva,
síndrome pós traumática e outras fobias crescentes que, aos
poucos, foram me tornando cada vez mais impotente para enfrentar o
desafio de sobreviver em meio a sociedade de valores romano-judaicos,
materialista-religiosista.
Medo
e prazer são as duas faces da mesma moeda. “Quanto maior as
ambições de um personagem, maiores serão suas contradições” -
Técnica para a construção de personagens literários e teatrais.
A
genial estratégia de “marketing” de Constantino, por volta de
350 D.C., de incorporar à sua a cultura judaica escravagista,
conseguiu dar longa sobrevida ao decadente Império Romano,
encobrindo sua arraigada crença no materialismo, com um manto de
“virginal religiosismo”. Mestres em inverter valores, conseguiram
transformar “sanguinário” em “sagrado”, ambas palavras
derivadas de sangue, mas com “justificativas” diferentes.
O
nosso EGO, nosso “EU” humano é essencialmente materialista. Não
poderia ser diferente, pois nasce de uma “reação” do
cérebro, que se antecipa à consciência, tentando fazer-se à
frente, já no primeiro maior desafio da vida no planeta, o
nascimento. Criado a partir da matéria (reação orgânica), não
poderia crer em outra coisa que não fosse a própria matéria.
O
EGO só pode crer na
realidade, posto que não pode vê-la,
atributo exclusivo da consciência. De olhos vendados pelo EGO, o
ser esta sujeito a todo tipo de deficiência e a consciência deste,
passa a materializar todas as visões do EGO, que se antecipa aos
fatos, tecendo uma perversa realidade imaginativa, já que sendo cego,
sem consciência, naturalmente teme o mundo, pois sua existência é
marcada pelas sucessivas e intermináveis colisões com os fatos, por
não poder vê-los. Como não vê o caminho, memoriza-o, tentando
evitar futuros desastres e mais dor. Esta memorização dá origem à
identidade do EGO, o “EU”, que como um GPS tentará guiá-lo na
sua trágica existência. Desde cedo vê-se isolado, separado de tudo
e todos pela própria identidade e isto, é motivo de intenso
sofrimento. Para não ver a si mesmo no espelho e reconhecer-se como
engodo-impotente, vergonha quase que de intolerável sofrimento, se
mascara, se encobre com o manto do “sagrado”, imaginado-se alma
imortal, quando no seu seio, reside a verdade de sua crença
materialista: VAI MORRER! - Desespero total!
Foi
assim, inspirado em si mesmo, que a “criatura” criou seu criador,
seu “DONO” e à sua mesma “imagem e semelhança”, seu
Império Romano, tornando-se o “senhor dos seus exércitos”, ao mesmo tempo acolhendo-o e alimentando-o através dos tempo, como seu fiel povo
seguidor!
O
gigantesco medo que sentia, não residia somente no acontecimento de
ter sido dado como escravo aos romanos. Haviam outras raízes muito
profundas que insuflavam com poderosos ventos a vela da vingança,
fazendo singrar forte a nau do ódio. Este navegar às cegas, capitaneado nos porões pelo medo, era desastroso. Contundentes
sucessivos fracassos financeiros. Dependências doentias em contínuos
novos relacionamentos, marcados por desgostos, desilusões,
superficialidades e trapaças. Solidão. Isolamento. Tristeza
profunda. Inconstância. Imaturidade para levar a cabo experiências
de vida, antes de poder aprender com elas. Entretanto enquanto
persistia este agonizante afogar-se no social, algo se manteve firme
e constante. Uma bússola interior insistia em marcar um norte para
aquela navegação. Parece que os
revolucionários radicais que havia adotado como oriente, tinham
sabedoria verdadeira para indicar uma luz, o tempo todo presente, que
indicasse a direção de um porto.
O
preço de procurar a verdade para tirar tudo a limpo, custasse o que
custasse, era alto. Muito alto! A morte. Para cavar fundo no
inconsciente até encontrar a ponta da última-primeira raiz, era
necessário vivenciar um a um todos os fracassos. Era preciso deixar
que acontecessem. Por baixo de cada um estava uma ponta de raiz do
medo maior, primordial. Pelo menos intuía que houvesse um. Cada dor
encontrada precisava ser liberada em sua expressão. Cada dor era uma
impotência que sustentava um fracasso.
Um
fato pode provocar dor. A memória deste fato provoca
sofrimento. O pensamento é memória. O “EU” é o pensamento.
Parafraseando e corrigindo Descartes eu diria: “Penso, logo... sou
o pensamento”! … Existo(?),...não! Pois o pensamento não
existe. É uma abstração do real. Como se forma esta abstração?
O
corpo é essencialmente memória. Vide o DNA, que é a semente única,
mas dá vida a incontáveis tipos distintos de células que formam
órgãos e estes o organismo. A matéria é memória. Átomos que se
reuniram formando moléculas e estas os mais distintos elementos da
natureza. Construída uma ordem funcional ela se mantém por si,
passando seus componentes a se atraírem pelas mesmas forças.
O
cérebro (repositório de memória), não podendo organizar um
acontecimento memorizado pelo organismo, ocorrido quando ainda
não dispunha de maturidade, nem dos recursos culturais adquiridos vigentes em uma sociedade, os interpreta, concebendo imagens
fantasiosas para explicá-los. Assim eu tinha vívidas imagens
sensoriais presenciadas como feto, ocultas da linguagem
cerebral. Isto percebido só recentemente. Precisava cavar mais fundo até chegar até elas.
É
da natureza racional do cérebro, a linearidade. Assim cada fato novo
é disposto em sequência e justificativa aos anteriores. Ou seja, o
novo tem que explicar o antigo, para que a história tenha “pé e
cabeça”, começo, meio e fim, o que é justamente próprio da
materialidade. Isto dá origem ao mundo fantasioso do EGO. Como esta
“explicação”, segundo a linearidade do cérebro, não encontra
correspondente com a realidade, o cérebro a esconde nas profundezas
do inconsciente, para que o indivíduo, não vendo a inexplicável
fantasia que fez da realidade, não adoeça de insanidade. Entretanto
estas imagens permanecem vivas e recorrentemente vem à tona tentando
organizar-se e integrar-se a realidade presente. Para reprimi-las o
próprio cérebro concebe a supersticiosidade e mistifica a realidade
presente, para que pelo menos ela se torne mais próxima do seu mundo
interior, o que equilibra o nível químico do cérebro. Perceba,
esta separação entre a memória inexplicada do ocorrido e o
presente, dá origem ao inconsciente, como um reservatório do
confuso, do inexplicável. Este inexplicável vem a tona
principalmente na forma de sonhos. Cria também outro precedente
terrivelmente nocivo para a saúde do ser: O TEMPO.
Então
como consegui sair deste inferno-labirinto?
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